Levantei da minha cama supondo ter sonhado, mas os gritos continuavam pela casa, gritos de dor, pensei, mas pareciam também de raiva. E tão selvagens e dissonantes que chocavam o coração. Não era ilusão, alguma coisa viva, algum lunático ou animal selvagem estava sendo terrivelmente torturado. A lembrança de Felipe e do esquilo passaram pela minha mente, e corri para a porta, mas ela havia sido trancada pelo lado de fora. Poderia sacudi-la o quanto quisesse, eu era um prisioneiro. E os gritos continuaram. Ora se suavizavam, parecendo um lamento – nessas horas, eu tinha certeza de que eram humanos –, ora rompiam em delírios dignos do inferno e enchiam a casa. Fiquei parado na porta prestando atenção, até que, finalmente, os gritos cessaram. Muito depois, ainda continuava a ouvi-los na minha imaginação, misturados à tempestade de vento. E, quando enfim me arrastei para a cama, o fiz com um mal-estar mortal e com o coração consumido num horror sombrio.

Como era de esperar, não pude mais dormir. Por que eu tinha sido trancado? O que se passava? De quem eram esses gritos indescritíveis e chocantes? Um ser humano? Seria inconcebível. Um animal? Os gritos eram demasiado brutais. E que animal menor do que um leão ou um tigre poderia fazer tremer as sólidas paredes dessa casa? Enquanto eu conjecturava sobre os elementos do mistério, me veio à mente a constatação de que ainda não havia posto os meus olhos na filha da casa. O que seria mais provável do que a filha da senhora e irmã de Felipe ser, ela mesma, insana? Ou, mais possivelmente, essas pessoas ignorantes e imbecis tratariam uma parente atormentada com violência? Eis uma solução, mas, ainda assim, quando buscava na memória os gritos (o que não fazia sem um calafrio), tudo junto parecia insuficiente; nem mesmo a crueldade poderia arrancar esses gritos de um louco. De uma coisa eu tinha certeza: não poderia viver em uma casa onde isso fosse, ainda que parcialmente, concebível sem investigar o assunto e, se necessário, interferir.

Amanheceu o dia. O vento cessara e nada havia que pudesse me lembrar dos acontecimentos da noite. Felipe chegou à cabeceira de minha cama demonstrando alegria. Quando passei pelo pátio, a senhora tomava sol em sua imobilidade costumeira. E quando atravessei o portão, encontrei a natureza sorrindo despretensiosamente, o céu num azul frio salpicado de grandes nuvens e as encostas das montanhas se destacavam em luzes e sombras. Uma rápida caminhada restaurou o domínio de mim mesmo e renovou minha determinação de resolver esse mistério. Com a vista privilegiada do outeiro, pude ver Felipe caminhando em direção ao seu trabalho no jardim e retornei à casa para colocar meu plano em prática. A senhora parecia mergulhada no sono.

Detive-me um pouco a observá-la, mas ela não se mexeu. Mesmo se meu plano fosse indiscreto, tinha pouco a temer de tal guardiã. Então, virando-me, subi para a galeria e comecei minha exploração pela casa.

Durante toda a manhã, fui de uma porta a outra e entrei em ambientes espaçosos e sem cor, alguns muito bem fechados, outros recebendo uma inundação da luz do dia, todos vazios e desinteressantes. Era uma casa rica onde o tempo havia deixado poeira e espalhado desilusão. Uma aranha balançava por ali, uma grande tarântula corria pelas cornijas; formigas faziam seus caminhos pelo chão das enormes salas; uma mosca-varejeira graúda, considerada mensageira da morte, havia feito ninho na madeira podre e zumbia obstinada pelos ambientes. Aqui e acolá, um banco ou dois, um sofá, uma cama ou uma grande cadeira esculpida que ficou para trás, como ilhas no chão nu, testemunhas da habitação do homem do passado, mas, por todo lado, as paredes estavam repletas de retratos dos mortos. Por essas efígies em decomposição, eu poderia julgar o quanto fora grande e bela a raça que viveu naquela casa. Muitos dos homens usavam insígnias no peito e tinham o porte de nobres oficiais. As mulheres estavam todas ricamente vestidas, e a maioria das telas era assinada por mãos famosas.