E o mudo e impenetrável azul respondia: “Olalla!”. A deusa pálida dos meus sonhos havia sumido para sempre, e, em seu lugar, eu via essa donzela em quem Deus havia derramado as mais ricas cores e as energias mais exuberantes da vida, a quem Ele havia feito tão ágil como um cervo, tão esbelta como um galho e em cujos grandes olhos havia acendido as tochas da alma. A emoção de sua jovem vida presa como um animal selvagem havia penetrado em mim. A força da alma que olhou a partir de seus olhos e conquistou a minha cobriu meu coração e chegou até os meus lábios em canto. Ela passou pelas minhas veias: ela e eu nos tornamos um único ser.

Não direi que esse entusiasmo definhou; antes, minha alma resistiu em seu êxtase como em um castelo fortificado, sendo inundado por frias e tristes considerações. Eu não poderia duvidar de que me apaixonei por ela à primeira vista com um ardor agitado que era estranho à minha experiência. O que então haveria a seguir? Ela era a criança de uma casa atormentada, a filha da senhora, a irmã de Felipe; ela ostentava isso mesmo em sua beleza. Tinha a leveza e a vivacidade do irmão, rápida como uma flecha, leve como orvalho; como o irmão, ela também brilhava no cenário pálido do mundo com o resplendor de flores. Entretanto, eu não poderia mais dar o nome de irmão àquele rapaz estúpido, nem de mãe àquele ser de carne imóvel e contemplativa cujos olhos e sorriso perpetuamente inexpressivos voltam agora à minha mente como algo detestável. E se eu não pudesse me casar com ela? Ela estava irremediavelmente desprotegida; seus olhos, naquele único e longo olhar que fora toda a nossa relação, haviam confessado uma fraqueza semelhante à minha; mas, em meu coração, eu a conhecia como a estudante dos aposentos frios do norte e autora daquelas tristes linhas; e esse é conhecimento suficiente para desarmar um bruto. Eu nunca teria coragem para fugir e assim fiz um voto de vigilância incansável.

Quando saí da janela, meus olhos recaíram sobre o retrato. Ele havia se apagado como uma vela após o nascer do sol; seguiu-me com olhos de tinta. Eu sabia que assim era, e, maravilhado pela tenacidade do tipo daquela raça em declínio, a semelhança foi apagada pela diferença. Lembrava como aquela imagem havia parecido para mim uma coisa inatingível em vida, uma criatura para além da modesta natureza do trabalho do pintor, e fiquei maravilhado com a ideia, exultei com a figura de Olalla. Beleza eu vira antes, mas nunca ficara encantado, e com frequência sentira-me atraído por mulheres que eram belas apenas para mim. Mas em Olalla estava reunido tudo o que eu desejara e que não ousara imaginar.

Não a vi no dia seguinte, e meu coração doeu. Meus olhos ansiavam por ela como se anseia pela manhã. Mas, no outro dia, quando voltei na hora usual, ela estava mais uma vez no alpendre, nossos olhares novamente se encontraram e se abraçaram. Eu teria falado, teria chegado perto dela, mas, tão forte quanto arrebatava meu coração me atraindo a ela como um ímã, algo ainda mais imperioso me retinha; e apenas consegui fazer uma reverência e seguir adiante, enquanto ela deixava minha saudação sem resposta, apenas me acompanhando com seus nobres olhos.

Eu tinha agora sua imagem de cor e, enquanto estudava seus traços na memória, era como se eu lesse seu próprio coração. Ela vestia algo do estilo de sua mãe, com preferência pelas cores. Seu manto, que sei foi feito por suas próprias mãos, envolvia-a com uma graça astuta. Seguindo a moda daquele país, o corpete se abria ao meio em uma longa fenda e ali, apesar da pobreza da casa, uma moeda de ouro pendurada por uma fita repousava em seu colo moreno. Essas eram provas, se alguma fosse necessária, de seu inato prazer pela vida e seu próprio charme. Por outro lado, em seus olhos, que se penduravam nos meus, pude ler profundidades além das profundezas de paixão e tristeza, lampejos de poesia e esperança, negrumes de desespero e pensamentos que eram superiores ao mundo. Era um corpo adorável, mas o ocupante, a alma, valia mais que o alojamento. Deveria eu deixar essa flor incomparável secar escondida nessas montanhas? Deveria eu desprezar o grande presente que me era ofertado no silêncio eloquente de seus olhos? Aqui havia uma alma emparedada; não deveria eu explodir sua prisão? Todos os argumentos paralelos foram derrubados. Era ela a filha de Herodes que eu havia jurado que se tornaria minha. E naquela mesma noite decidi, com um misto de traição e vergonha, cativar o irmão. Talvez eu passasse a vê-lo com olhos mais favoráveis, talvez o pensamento da irmã sempre fizesse aflorar as melhores qualidades daquela alma imperfeita, mas ele jamais havia me parecido tão amigável, e sua própria semelhança com Olalla me incomodava, mas também me comovia.

Um terceiro dia passou em vão, um vazio deserto de horas. Eu não perderia mais nenhuma oportunidade, e fiquei a tarde inteira no pátio onde (para ser tolerante comigo mesmo) falei mais do que o normal com a senhora.