O’Callaghan.
— Ah, sr. D’Arcy, disse Mary Jane, é uma maldade o senhor se interromper desse jeito enquanto nós todos o ouvíamos encantados.
— Estive no pé dele a noite inteira, disse a srta. O’Callaghan, e a sra. Conroy também, mas ele disse que estava com uma gripe terrível e que não podia cantar.
— Ah, sr. D’Arcy, disse a Tia Kate, que mentira.
— Por acaso a senhora não vê que eu estou rouco como um corvo?, perguntou o sr. D’Arcy de maneira ríspida.
Em seguida entrou na despensa e vestiu o sobretudo. Os outros, perplexos com a resposta grosseira, não souberam o que dizer. A Tia Kate franziu a testa e com um gesto indicou aos outros que deixassem o assunto de lado. O sr. D’Arcy enrolava o pescoço cuidadosamente com uma expressão mal-humorada.
— É o tempo, disse a Tia Julia depois de um intervalo.
— Todo mundo acaba se gripando, disse a Tia Kate, todo mundo.
— Disseram que essa é a neve mais forte dos últimos trinta anos, disse Mary Jane; e hoje de manhã eu li no jornal que está nevando em toda a Irlanda.
— Eu adoro a paisagem nevada, disse a Tia Julia com uma nota triste na voz.
— Eu também, concordou a srta. O’Callaghan. Acho que o Natal só é Natal quando o chão está coberto de neve.
— Mas o pobre do sr. D’Arcy não gosta da neve, disse a Tia Kate, sorrindo.
O sr. D’Arcy saiu da despensa, todo enrolado e abotoado, e em tom arrependido contou a história da gripe que o afligia. Todos lhe deram conselhos e disseram que era uma pena e pediram que cuidasse bem da garganta naquela noite fria. Gabriel ficou observando a esposa, que não participou da conversa. Estava parada bem debaixo da claraboia empoeirada e a chama do gás iluminava o bronze dos cabelos que Gabriel a tinha visto secar em frente à lareira alguns dias atrás. Ela mantinha a mesma pose e parecia alheia à conversa que se desenrolava lá embaixo. Por fim virou-se em direção aos outros e Gabriel viu que ela tinha as faces coradas e que os olhos brilhavam. Uma súbita maré de alegria inundou-lhe o coração.
— Sr. D’Arcy, perguntou ela, como se chama a canção que o senhor estava cantando?
— Se chama The Lass of Aughrim, respondeu o sr. D’Arcy, mas eu não consegui me lembrar direito da letra. Por quê? A senhora conhece?
– The Lass of Aughrim, ela repetiu. Eu não conseguia me lembrar do nome.
— É uma melodia muito bonita, disse Mary Jane. Uma pena que o senhor está sem voz.
— Ora, Mary Jane, disse a Tia Kate, não amole o sr. D’Arcy. Não quero que ninguém o incomode!
Ao ver que todos estavam prontos para ir embora a Tia Kate pastoreou-os até a porta, onde os boas-noites foram dados:
— Bem, então boa noite, Tia Kate, e obrigado pela noite agradável.
— Boa noite, Gabriel. Boa noite, Gretta!
— Boa noite, Tia Kate, e muito obrigada. Boa noite, Tia Julia.
— Ah, boa noite, Gretta, eu não tinha visto você.
— Boa noite, sr. D’Arcy.
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