Agora já não era mais possível lutar com aquele inimigo que se aproveitava de seu equipamento e evitava a abordagem.
Sandokan, contudo, ainda não queria ceder.
Derrubando com empurrões insustentáveis os homens que o rodeavam, se inclinou sobre o canhão que estava carregado, corrigiu a mira e abriu fogo.
Poucos segundos depois, o mastro principal do cruzador, atingido na base, se precipitava ao mar junto com todos os marinheiros que se encontravam nas plataformas do mastro, nos cestos de gávea e nas vergas.
Enquanto a nau de guerra parava para salvar os homens que estavam quase se afogando e suspendia o fogo, Sandokan aproveitava para embarcar no próprio barco a tripulação de Giro-Batol.
— Agora para a costa, e depressa! — trovejou.
O praho de Giro-Batol, que se mantinha à tona por um verdadeiro prodígio, foi rapidamente liberado e abandonado às ondas com sua carga de cadáveres e as peças de artilharia agora imprestáveis.
Imediatamente os piratas pegaram os remos e, aproveitando o momento de inação do cruzador, se distanciaram depressa e se refugiaram no pequeno rio.
Foi a tempo! O pobre navio, que fazia água por toda parte, apesar dos remendos enfiados apressadamente nos buracos abertos pelas balas do vaso de guerra, afundava lentamente, gemendo como um moribundo sob o peso do líquido invasor e inclinando para bombordo.
Sandokan, que se postara na barra do timão, levou o barco para a margem próxima e o encalhou num banco de areia.
Assim que os piratas se deram conta de que não corriam mais nenhum perigo de afundar, irromperam de sob a coberta como um bando de tigres esfaimados, com as armas em punho, as feições contraídas pela fúria, prontos para recomeçar a luta com a mesma ferocidade e decisão.
Sandokan os deteve com um gesto e disse, olhando o relógio que levava na cintura:
— São seis horas; mais duas e o sol terá desaparecido. A noite terá caído no mar. Que cada um de vocês comece a trabalhar sem descanso para que o praho esteja pronto para voltar ao mar lá pela meia-noite.
— Vamos atacar o cruzador? — perguntaram os piratas, agitando freneticamente as armas.
— Não prometo, mas juro que não está longe o dia em que nos vingaremos dessa derrota. Com o relampejar dos canhões, mostraremos a nossa bandeira hasteada nos bastiões de Vitória.
— Viva o Tigre! — berraram os piratas.
— Silêncio — trovejou Sandokan. — Vamos enviar dois homens à foz do rio para observar o cruzador e outros dois para os bosques, para evitar qualquer tipo de surpresa. Vamos cuidar dos feridos e, depois, todos ao trabalho.
Enquanto os piratas se apressavam a fazer com que os feridos fossem reunidos num só ponto, Sandokan se dirigiu à popa e ficou alguns minutos observando a baía, cujo espelho de água podia ser avistado de um trecho da floresta.
Tentava, sem dúvida, descobrir onde estava o cruzador, mas parecia que ele não ousara se aventurar muito perto da costa, talvez por medo de encalhar nos diversos bancos de areia que se estendiam por lá.
— Ele sabe se conter — murmurou o terrível pirata. — Está esperando sairmos de novo em mar aberto para nos exterminar, mas se pensa que vou lançar meus homens à abordagem, está enganado. O Tigre também sabe ser prudente.
Sentou-se no canhão e chamou Sabau.
O pirata, um dos mais valentes, que já tinha obtido o posto de subchefe depois de ter arriscado vinte vezes a própria pele, logo acorreu.
— Patan e Giro-Batol foram mortos — disse Sandokan com um suspiro. Foram abatidos no outro praho, à frente de homens corajosos que tentavam atrair para nós a maldita nau. O comando agora cabe a você e está sendo conferido por mim.
— Obrigado, Tigre da Malásia.
— Você será tão valente quanto eles.
— Quando o meu chefe me mandar para a morte, estarei pronto a obedecer.
— Por enquanto, me ajude.
Unindo forças, empurraram o canhão e as balistas até a popa e os apontaram para a pequena baía. Assim poderiam varrê-la com chuvas de metralha caso as chalupas do cruzador tentassem chegar à força à foz do rio.
— Agora estamos seguros —, disse Sandokan. — Você mandou dois homens para a foz do rio?
— Mandei, Tigre da Malásia. Devem estar preparando uma emboscada no meio do canavial.
— Ótimo.
— Vamos esperar a noite cair antes de sair para o mar?
— Vamos, Sabau.
— Acha que vamos conseguir enganar o cruzador?
— A lua vai nascer bem tarde e talvez nem sequer apareça. E estou vendo algumas nuvens chegando do sul.
— Nossa rota será Mompracem, chefe?
— Direto para lá.
— E a vingança?
— Somos muito poucos, Sabau, para enfrentar a tripulação do cruzador; e depois, como responder àquela artilharia? O nosso navio não está em condições de sustentar um novo combate.
— É verdade, chefe.
— Paciência agora; o dia da vingança vai chegar logo.
Enquanto os dois chefes conversavam, os homens trabalhavam com uma obstinação febril. Eram todos marinheiros valentes e, entre eles, não faltavam nem carpinteiros nem marceneiros.
Em cerca de apenas quatro horas ergueram dois novos mastros pequenos, repararam o costado, tamparam todos os furos e consertaram os massames, contando com uma abundância de cabos, fibras, correntes e cordas a bordo.
Às dez horas, o navio podia não só voltar ao mar, mas até mesmo enfrentar um novo combate, graças às novas barricadas levantadas com troncos de árvores para proteger o canhão e as balistas.
Durante aquelas quatro horas, nenhuma chalupa do cruzador ousara aparecer nas águas da baía.
O comandante inglês, sabendo com que tipo de indivíduos teria que lidar, não achara oportuno pôr em risco a vida de seus homens em uma luta fora da água.
Por outro lado, devia estar se sentindo completamente seguro de poder obrigar os piratas a se renderem ou a lançá-los à costa, se tentassem atacar ou voltar ao mar.
Por volta das onze, Sandokan, que estava resolvido a tentar se fazer ao mar, mandou chamar os homens que estavam de tocaia na foz do rio.
— A baía está livre? — perguntou.
— Está — respondeu um dos dois.
— E o cruzador?
— Está à frente da baía.
— Muito longe?
— Meia milha, mais ou menos.
— Temos espaço suficiente para passar — murmurou Sandokan. — As trevas vão proteger a nossa retirada.
Em seguida, se voltou para Sabau e disse:
— Vamos embora.
Imediatamente quinze homens desceram para o banco de areia e empurraram o praho para o rio com um solavanco poderoso.
— Ninguém pode soltar um pio, qualquer que seja o motivo — disse Sandokan com voz imperiosa. — Em vez disso, mantenham os olhos bem abertos e as armas prontas. Estamos prestes a jogar uma partida arriscadíssima.
Sentou-se perto da barra do timão com Sabau a seu lado e dirigiu resolutamente o barco para a foz do rio.
A escuridão favorecia a fuga. Não havia lua no céu, nem sequer uma estrela ou aquele leve clarão projetado pelas nuvens quando o astro noturno o iluminava de cima.
Grossas nuvens haviam invadido o arco celeste, interceptando completamente qualquer claridade. A sombra projetada pelos gigantescos durion, pelas palmeiras e pela imensa confusão de bananeiras era tal, que Sandokan tinha dificuldade em distinguir as duas margens do rio.
Um silêncio profundo reinava naquele pequeno rio e era quebrado apenas pelo fraco borbulhar das águas. Não se ouvia nenhum sussurro das folhas, não havia nem um hálito de vento por baixo dos arcos escuros daqueles enormes vegetais, nem na ponte do navio se ouvia um único murmúrio.
Parecia que todos aqueles homens postados entre a proa e a popa não respiravam mais, com medo de perturbar aquela calma.
O praho já estava próximo da foz do rio quando, depois de um leve atrito, parou.
— Encalhou? — perguntou Sandokan rapidamente.
Sabau se curvou sobre o costado e examinou atentamente as águas.
— Encalhou — respondeu. — Tem um banco embaixo de nós.
— Vamos passar?
— A maré está subindo depressa e acho que em poucos minutos poderemos continuar a descer o rio.
— Temos que esperar, então.
A tripulação, embora ignorasse por que o praho interrompera o curso, não se movera. Mas Sandokan ouvira o rangido bem nítido das carabinas sendo armadas e avistara os artilheiros se curvando silenciosamente sobre o canhão e as duas balistas.
Passaram-se alguns minutos de expectativa angustiada para todos e então se ouviram ruídos de atrito vindo da proa e sob a quilha. O praho, liberado pela maré que subia rapidamente, deslizava sobre o banco de areia.
De repente, ficou livre daquele fundo resistente, ondulando levemente.
— Desdobre uma vela — comandou brevemente Sandokan aos homens dos massames.
— Vai ser suficiente, chefe? — perguntou Sabau.
— Por ora, vai.
Logo depois uma vela latina foi desdobrada no traquete. Fora tingida de preto, de maneira que devia se confundir completamente com as sombras da noite.
O praho acelerou a descida, acompanhando o serpentear do rio. Felizmente superou todas as barreiras, passando entre os bancos de areia e os obstáculos, atravessou a pequena baía e se fez ao mar em silêncio total.
— A nave de guerra? — indagou Sandokan, ficando em pé de um salto.
— Lá está ela, a meia milha de nós — respondeu Sabau.
Na direção indicada era possível avistar confusamente uma massa escura, sobre a qual pequenos pontos de luminosidade de vez em quando davam piruetas, com certeza escórias que escapavam da chaminé.
Prestando-se bastante atenção, lamentos surdos das caldeiras também podiam ser ouvidos.
— Tem fogo aceso até agora — murmurou Sandokan. — Ele ainda está nos esperando.
— Vamos passar despercebidos, chefe? — perguntou Sabau.
— Espero que sim. Você está vendo alguma chalupa?
— Nenhuma, chefe.
— Primeiro vamos acompanhando a praia, para nos confundirmos melhor com as plantas, depois nos faremos ao largo.
O vento estava razoavelmente fraco, e o mar estava calmo como se fosse uma mancha de óleo.
Sandokan ordenou que fosse desdobrada também uma vela no mastro principal e então avançou com o navio na direção sul, acompanhando a sinuosidade da costa.
Como as praias eram cobertas por grandes árvores que projetavam uma sombra fechada sobre as águas, havia pouca probabilidade de que o pequeno navio corsário viesse a ser descoberto.
Sandokan, sempre na barra, não perdia de vista o temível adversário que, de um instante para o outro, poderia despertar e cobrir o mar e a costa com chuvas de ferro e de chumbo.
Estava se esforçando para enganá-lo, mas, no fundo da alma, aquele homem orgulhoso se doía por ter que deixar aquelas paragens sem a revanche. Desejava já se encontrar em Mompracem, mas também desejava outra daquelas tremendas batalhas. Ele, o terrível Tigre da Malásia, o invencível chefe dos piratas de Mompracem, estava quase envergonhado por ter que navegar assim, sorrateiramente, como um ladrão noturno.
Só de pensar nisso, seu sangue fervia e o olhar ardia com uma cólera assustadora. Ah! Como teria aclamado um tiro de canhão, mesmo que fosse o sinal de uma nova e desastrosa derrota!
O praho já se afastara cerca de quinhentos ou seiscentos passos da baía e se preparava para se fazer ao largo quando à popa, na esteira, apareceu um estranho tipo de fagulhas. Parecia que uma miríade de pequeninas chamas surgia das profundezas tenebrosas do mar.
— Alguma coisa nos traiu — disse Sabau.
— Tanto melhor — respondeu Sandokan com um sorriso feroz. — Não, esta retirada não era digna de nós.
— É verdade, capitão — replicou o malaio. — Melhor morrer com as armas em punho do que fugir como chacais.
O mar ficava cada vez mais fosforescente. À frente da proa e atrás da popa do navio, os pontos luminosos se multiplicavam e a esteira se iluminava mais ainda. Parecia que o praho estava deixando atrás de si um rastro de betume ardente ou de enxofre líquido.
Aquela faixa que cintilava vivamente na escuridão circundante não passaria despercebida pelas sentinelas do cruzador. A qualquer momento os canhões poderiam começar a trovejar inesperadamente.
Também os piratas a postos na coberta observavam aquela fosforescência, mas nenhum deles fizera um gesto sequer ou pronunciara uma única palavra que pudesse trair alguma apreensão. Nem eles conseguiam se conformar em ir embora sem disparar um tiro de fuzil.
Uma chuva de metralha teria sido saudada com urros de alegria.
Haviam transcorrido apenas dois ou três minutos quando Sandokan, que mantinha o olhar fixo no cruzador, viu que se acendiam as luzes de navegação.
— Talvez tenham percebido agora? — se perguntou.
— Acho que sim, chefe — respondeu Sabau.
— Olhe!
— É, estou vendo que as escórias estão saindo da chaminé em mais quantidade.
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