De eles a mim o vário campo ao vento, à brisa, Ou verde ou amarelo ou variegado,

Ondula incertamente.

Débil como uma haste de papoila

Me suporta o momento. Nada quero.

Que pesa o escrúpulo do pensamento

Na balança da vida?

Como os campos, e vário, e como eles,

Exterior a mim, me entrego, filho

Ignorado do Caos e da Noite

Às férias em que existo.

Bocas Roxas

Bocas roxas de vinho,

Testas brancas sob rosas,

Nus, brancos antebraços

Deixados sobre a mesa;

Tal seja, Lídia, o quadro

Em que fiquemos, mudos,

Eternamente inscritos

Na consciência dos deuses.

Antes isto que a vida

Como os homens a vivem

Cheia da negra poeira

Que erguem das estradas.

Só os deuses socorrem

Com seu exemplo aqueles

Que nada mais pretendem

Que ir no rio das coisas.

Breve o Dia

Breve o dia, breve o ano, breve tudo.

Não tarda nada sermos.

Isto, pensado, me de a mente absorve

Todos mais pensamentos.

O mesmo breve ser da mágoa pesa-me,

Que, inda que mágoa, é vida.

Cada Coisa

Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.

Não florescem no inverno os arvoredos,

Nem pela primavera Têm branco frio os campos.

À noite, que entra, não pertence, Lídia,

O mesmo ardor que o dia nos pedia.

Com mais sossego amemos A nossa incerta vida.

À lareira, cansados não da obra

Mas porque a hora é a hora dos cansaços,

Não puxemos a voz Acima de um segredo,

E casuais, interrompidas, sejam

Nossas palavras de reminiscência

(Não para mais nos serve A negra ida do Sol) —

Pouco a pouco o passado recordemos

E as histórias contadas no passado

Agora duas vezes Histórias, que nos falem

Das flores que na nossa infância ida

Com outra consciência nós colhíamos

E sob uma outra espécie

De olhar lançado ao mundo.

E assim, Lídia, à lareira, como estando,

Deuses lares, ali na eternidade,

Como quem compõe roupas

O outrora compúnhamos

Nesse desassossego que o descanso

Nos traz às vidas quando só pensamos

Naquilo que já fomos, E há só noite lá fora.

Cada dia sem gozo não foi teu

Cada dia sem gozo não foi teu

Foi só durares nele.

Quanto vivas Sem que o gozes, não vives.

Não pesa que amas, bebas ou sorrias:

Basta o reflexo do sol ido na água

De um charco, se te é grato.

Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas

Seu prazer posto, nenhum dia nega

A natural ventura!

Cada Um

Cada um cumpre o destino que lhe cumpre,

E deseja o destino que deseja;

Nem cumpre o que deseja,

Nem deseja o que cumpre.

Como as pedras na orla dos canteiros

O Fado nos dispõe, e ali ficamos;

Que a Sorte nos fez postos

Onde houvemos de sê-lo.

Não tenhamos melhor conhecimento

Do que nos coube que de que nos coube.

Cumpramos o que somos.

Nada mais nos é dado.

Como

Como se cada beijo

Fora de despedida,

Minha Cloe, beijemo-nos, amando.

Talvez que já nos toque

No ombro a mão, que chama

À barca que não vem senão vazia;

E que no mesmo feixe

Ata o que mútuos fomos

E a alheia soma universal da vida.

Coroai-me

Coroai-me de rosas,

Coroai-me em verdade,

De rosas — Rosas que se apagam

Em fronte a apagar-se Tão cedo!

Coroai-me de rosas

E de folhas breves.

E basta.

Cuidas, Índio

Cuidas, ínvio, que cumpres, apertando

Teus infecundos, trabalhosos dias

Em feixes de hirta lenha, Sem ilusão a vida.