A tua lenha é só peso que levas

Para onde não tens fogo que te aqueça,

Nem sofrem peso aos ombros

As sombras que seremos.

Para folgar não folgas; e, se leoas,

Antes legues o exemplo, que riquezas,

De como a vida basta Curta, nem também dura.

Pouco usamos do pouco que mal temos.

A obra cansa, o ouro não é nosso.

De nós a mesma fama Ri-se, que a não veremos Quando, acabados pelas Parcas, formos,

Vultos solenes, de repente antigos,

E cada vez mais sombras,

Ao encontro fatal —

O barco escuro no soturno rio,

E os novos abraços da frieza stígia

E o regaço insaciável Da pátria de Plutão.

Da Lâmpada

Da lâmpada noturna

A chama estremece

E o quarto alto ondeia.

Os deuses concedem

Aos seus calmos crentes

Que nunca lhes trema

A chama da vida

Perturbando o aspecto

Do que está em roda,

Mas firme e esguiada

Como preciosa

E antiga pedra,

Guarde a sua calma

Beleza contínua.

Da Nossa Semelhança

Da nossa semelhança com os deuses

Por nosso bem tiremos

Julgarmo-nos deidades exiladas

E possuindo a Vida

Por uma autoridade primitiva

E coeva de Jove.

Altivamente donos de nós-mesmos,

Usemos a existência

Como a vila que os deuses nos concedem

Para, esquecer o estio.

Não de outra forma mais apoquentada

Nos vale o esforço usarmos

A existência indecisa e afluente

Fatal do rio escuro.

Como acima dos deuses o Destino

É calmo e inexorável,

Acima de nós-mesmos construamos

Um fado voluntário

Que quando nos oprima nós sejamos

Esse que nos oprime,

E quando entremos pela noite dentro

Por nosso pé entremos.

De Apolo

De Apolo o carro rodou pra fora

Da vista.

A poeira que levantara

Ficou enchendo de leve névoa o horizonte;

A flauta calma de Pã, descendo

Seu tom agudo no ar pausado,

Deu mais tristezas ao moribundo

Dia suave.

Cálida e loura, núbil e triste,

Tu, mondadeira dos prados quentes,

Ficas ouvindo, com os teus passos

Mais arrastados,

A flauta antiga do deus durando

Com o ar que cresce pra vento leve,

E sei que pensas na deusa clara

Nada dos mares,

E que vão ondas lá muito adentro

Do que o teu seio sente cansado

Enquanto a flauta sorrindo chora

Palidamente.

De Novo Traz

De novo traz as aparentes novas

Flores o verão novo, e novamente

Verdesce a cor antiga

Das folhas redivivas.

Não mais, não mais dele o infecundo abismo, Que mudo sorve o que mal somos, torna

À clara luz superna A presença vivida.

Não mais; e a prole a que, pensando, dera

A vida da razão, em vão o chama,

Que as nove chaves fecham,

Da Estige irreversível.

O que foi como um deus entre os que cantam, O que do Olimpo as vozes, que chamavam,

'Scutando ouviu, e, ouvindo,

Entendeu, hoje é nada.

Tecei embora as, que teceis, Grinaldas.

Quem coroais, não coroando a ele?

Votivas as deponde,

Fúnebres sem ter culto.

Fique, porém, livre da leiva e do Orco,

A fama; e tu, que Ulisses erigira,

Tu, em teus sete montes,

Orgulha-te materna,

Igual, desde ele às sete que contendem

Cidades por Homero, ou alcaica Lesbos,

Ou heptápila Tebas Ogígia mãe de Píndaro.

Deixemos, Lídia

Deixemos, Lídia, a ciência que não põe

Mais flores do que Flora pelos campos,

Nem dá de Apolo ao carro

Outro curso que Apolo.

Contemplação estéril e longínqua

Das coisas próximas, deixemos que ela

Olhe até não ver nada Com seus cansados olhos.

Vê como Ceres é a mesma sempre

E como os louros campos intumesce

E os cala prás avenas Dos agrados de Pã.

Vê como com seu jeito sempre antigo

Aprendido no orige azul dos deuses,

As ninfas não sossegam Na sua dança eterna.

E como as heniadríades constantes

Murmuram pelos rumos das florestas

E atrasam o deus Pã. Na atenção à sua flauta.

Não de outro modo mais divino ou menos

Deve aprazer-nos conduzir a vida,

Quer sob o ouro de Apolo Ou a prata de Diana.

Quer troe Júpiter nos céus toldados.

Quer apedreje com as suas ondas

Netuno as planas praias E os erguidos rochedos.