Tomo nas mãos, como caveira, ou chave

De supérfluo sepulcro, o meu destino,

E ignaro o aborreço Sem coração que o sinta.

Lídia

Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros

Onde que quer que estejamos.

Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros

Onde quer que moremos, Tudo é alheio

Nem fala língua nossa.

Façamos de nós mesmos o retiro

Onde esconder-nos, tímidos do insulto

Do tumulto do mundo.

Que quer o amor mais que não ser dos outros?

Como um segredo dito nos mistérios,

Seja sacro por nosso.

Melhor Destino

Melhor destino que o de conhecer-se

Não frui quem mente frui. Antes, sabendo,

Ser nada, que ignorando:

Nada dentro de nada.

Se não houver em mim poder que vença

As Parcas três e as moles do futuro,

Já me dêem os deuses o poder de sabê-lo;

E a beleza, incriável por meu sestro,

Eu goze externa e dada, repetida

Em meus passivos olhos,

Lagos que a morte seca.

Mestre

Mestre, são plácidas

Todas as horas

Que nós perdemos,

Se no perdê-las,

Qual numa jarra,

Nós pomos flores.

Não há tristezas

Nem alegrias

Na nossa vida.

Assim saibamos,

Sábios incautos,

Não a viver,

Mas decorrê-la,

Tranqüilos, plácidos,

Lendo as crianças

Por nossas mestras,

E os olhos cheios

De Natureza ...

À beira-rio,

À beira-estrada,

Conforme calha,

Sempre no mesmo

Leve descanso

De estar vivendo.

O tempo passa,

Não nos diz nada.

Envelhecemos.

Saibamos, quase

Maliciosos,

Sentir-nos ir.

Não vale a pena

Fazer um gesto.

Não se resiste

Ao deus atroz

Que os próprios filhos

Devora sempre.

Colhamos flores.

Molhemos leves

As nossas mãos

Nos rios calmos,

Para aprendermos

Calma também.

Girassóis sempre

Fitando o sol,

Da vida iremos

Tranqüilos,tendo

Nem o remorso

De ter vivido.

Meu Gesto

Meu gesto que destrói

A mole das formigas,

Tomá-lo-ão elas por de um ser divino;

Mas eu não sou divino para mim.

Assim talvez os deuses

Para si o não sejam,

E só de serem do que nós maiores

Tirem o serem deuses para nós.

Seja qual for o certo,

Mesmo para com esses

Que cremos serem deuses, não sejamos

Inteiros numa fé talvez sem causa.

Nada Fica

Nada fica de nada. Nada somos.

Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos

Da irrespirável treva que nos pese

Da humilde terra imposta,

Cadáveres adiados que procriam.

Leis feitas, estátuas vistas, odes findas —

Tudo tem cova sua. Se nós, carnes

A que um íntimo sol dá sangue, temos

Poente, por que não elas?

Somos contos contando contos, nada.