O ar ficou tenso por um momento. Então, Le Loup relaxou e perguntou de forma solene:

– Quem era a menina? Sua esposa?

– Nunca a tinha visto antes – respondeu Kane.

Nom d’un nom! – praguejou o bandido. – Que tipo de homem é você, monsieur, que se dedica a uma contenda desse tipo para vingar uma meretriz que nem sequer conhecia?

– Isso, senhor, é problema meu; portanto, é suficiente que eu o faça!

Kane não poderia esclarecer melhor a situação. Na verdade, ele também nunca buscou uma explicação dentro de si mesmo. Como um verdadeiro fanático, seus incitamentos eram motivos suficientes para suas ações.

– Você está certo, monsieur – Le Loup tentou ganhar tempo, recuando, pé ante pé, com habilidade teatral tão consumada que não despertou a menor suspeita do falcão que o observava. – Monsieur, possivelmente você me dirá que é apenas mais um nobre cavaleiro, vagando como um verdadeiro Galahad, que protege os mais fracos; mas nós dois sabemos que não é verdade. Ali, no chão, há o equivalente ao resgate de um império. Vamos dividir o montante pacificamente. Então, se desgostar de minha companhia – nom d’un nom! –, vamos cada um para um lado, seguindo nossos caminhos.

Kane inclinou-se para a frente, com uma terrível ameaça crescendo em seus olhos frios, como um grande condor prestes a se lançar sobre sua vítima.

– Senhor, acredita que sou um vilão tão torpe quanto você?

De repente, Le Loup jogou a cabeça para trás e, em selvagem zombaria, com seus olhos dançando e saltitando, manifestou um tipo de despreocupação insana ao soltar gargalhadas que ecoaram pelo ar.

– Deuses do inferno! Não, seu tolo, não o comparo a mim mesmo. Mon Dieu, monsieur Kane, você decerto tem uma grande tarefa se pretende vingar todas as meretrizes que conheceram meus favores!

– Sombras da morte! Perco meu tempo tagarelando com um canalha! – Kane rosnou, com voz sedenta de sangue, e sua estrutura delgada lampejou para a frente como um arco curvado que é subitamente solto.

No mesmo instante, Le Loup, com uma gargalhada indômita, curvou-se para trás com um movimento tão rápido quanto o de Kane. Seu timing foi perfeito; suas mãos agarraram a mesa e a viraram de ponta-cabeça, mergulhando a caverna na escuridão quando a vela caiu no chão. O florete de Kane cantou como uma flecha no escuro, golpeando às cegas e ferozmente.

Adieu, monsieur Galahad!

O insulto veio de algum ponto à sua frente, mas Kane, rumando em direção ao som com fúria primitiva, trombou com uma parede lisa que não cedeu aos seus golpes. De algum lugar, ele ouvia o eco de um riso zombeteiro.

Kane virou-se, com os olhos fixos na entrada do covil, imaginando que seu inimigo tentaria passar por ele sorrateiramente e fugir, mas nenhuma forma se delineou ali. Quando suas mãos, tateando, encontraram a vela e a acenderam, a caverna estava vazia.

3. O canto dos tambores

O suspiro veio atravessando as águas escuras: boom, boom, boom! – uma reiteração soturna. Distante e mais débil, soou um sussurro de timbre diferente: thrum, throom, thrum! As vibrações iam e vinham, enquanto os tambores pulsantes conversavam uns com os outros. Que histórias traziam? Que segredos monstruosos sussurravam ao longo dos recessos sombrios da selva não mapeada?

– Você tem certeza que esta é a baía na qual o navio espanhol atracou?

– Sim, senhor; o negro jura que esta é a baía onde o homem branco largou o navio e foi para a selva.

Kane acenou com a cabeça, rabugento.

– Então, deixe-me descer aqui, sozinho. Espere sete dias; se eu não retornar e você não ouvir notícias minhas, solte as velas e levante a âncora para zarpar quando quiser.

– Sim, senhor.

As ondas batiam preguiçosamente nas laterais do bote que levou Kane até a orla do rio, onde ficava o vilarejo, um pouco afastado da costa da baía e no meio da selva, escondido da visão dos tripulantes do navio.

Kane preferiu o curso mais perigoso, que era cruzar a praia à noite. Pelo que sabia, se o homem que buscava estivesse no vilarejo, ele jamais chegaria até lá na luz do dia. Por isso, tomou a medida mais desesperada: desafiar a selva noturna. Durante toda a sua vida acostumara-se a fazer escolhas desesperadas. Assim, jogava com a pequena chance de chegar ao vilarejo sombrio encoberto pelas trevas, sem que seus moradores o vissem.

Na margem, ele desceu do bote e, com gestos e sinais de comando mudos, mandou os remadores retornarem ao navio, ancorado a uma certa distância da baía. Kane deu meia-volta e se embrenhou na densidão da mata. Espada em uma mão e um punhal na outra. Seguiu em frente, na direção em que os tambores murmuravam e grunhiam. Movimentando-se com a facilidade de um leopardo, pisava com cautela, com todos os nervos alertas e tensos. O caminho não era fácil. Raízes o faziam tropeçar e folhagens estapeavam seu rosto, dificultando seu progresso. Foi forçado a tatear o percurso entre os troncos de árvores enormes, e tudo na vegetação rasteira que o cercava parecia vago, emitindo sussurros ameaçadores, com sombras em movimento. Em três ocasiões, quando seu pé tocou em algo que se movia, recuou rápido e parou para perscrutar.