Ainda uma vez chegou a vislumbrar o brilho pernicioso de olhos felinos entre as árvores. Contudo, conforme avançou, eles desapareceram.
Thrum, thrum, thrum – era o enfado sem fim dos tambores. Guerra e morte, eles diziam. Sangue e luxúria, sacrifício humano e banquete antropófago! E os tambores ecoando a alma da África. O espírito da selva, o canto dos deuses das trevas exteriores, os deuses que rugem e gritam. Os homens-deuses sabiam quando as alvoradas eram jovens. Feras com bocarras e olhos abertos, barrigas enormes, mãos ensanguentadas, Deuses Negros... Tudo isso, além dos tambores, rugia e gritava para Kane, enquanto ele abria caminho pela floresta.
Em algum lugar de sua alma, um acorde sensível foi atingido e respondeu. Você também é da noite, disseram os tambores; existe a força das trevas, a força do primitivo dentro de você, que remonta as mais antigas eras; deixe-nos ensinar-lhe, deixe-nos ensinar-lhe, cantaram os tambores.
Kane saiu da mata fechada e desembocou em uma trilha. Além das árvores, vinha o fulgor das fogueiras do vilarejo, labaredas brilhando através das paliçadas. Kane seguiu a trilha – veloz, silencioso e atento, com a espada em riste à sua frente, apertando os olhos para captar o mínimo movimento nas trevas – entre as árvores que se assomavam como gigantes sinistros de ambos os lados. Às vezes, seus grandes galhos se entrelaçavam acima de sua cabeça, permitindo que ele visse apenas uma pequena parte do caminho diante de si.
Ele moveu-se como um fantasma escuro ao longo da trilha sombria; em alerta, observava e escutava, mas nenhum aviso chegou antes de ele ser nocauteado por uma grande massa indistinta que saiu das sombras, em silêncio.
4. O Deus Negro
Thrum, thrum, thrum! Em algum lugar, com uma monotonia ensurdecedora, uma cadência repetia sem parar, sustentando o mesmo tema: “Tolo, tolo, tolo!” Agora não estava distante – Kane quase podia alcançá-la ao estender a mão –, e se fundia com o latejar de sua cabeça até formar um mesmo eco contínuo: “Tolo, tolo, tolo, tolo!”
As névoas minguaram e desapareceram. Kane tentou apalpar a cabeça, mas descobriu que estava com mãos e pés amarrados. E deitado no chão de uma cabana... Sozinho? Contorceu-se para ver o lugar. Não, dois olhos o observavam no meio das trevas. Uma silhueta aos poucos tomou forma, e Kane, ainda tonto, por um momento acreditou ser o homem que o deixara inconsciente. Mas não era. Não. Aquele homem jamais poderia ter dado tal golpe. Ele era magro, pequeno e enrugado. A única coisa nele que parecia viva eram seus olhos, que se assemelhavam aos de uma cobra.
O homem agachou-se no chão da cabana, próximo à entrada da porta, nu, exceto por uma tanga e a parafernália usual de braceletes, tornozeleiras e braçadeiras. Enfeites bizarros de marfim, ossos e couro, animais e humanos, adornavam seus braços e pernas. De repente, e inacreditavelmente, ele falou em inglês, meio truncado.
– Argh! Você acordado, homem branco? Por que veio aqui, ahn?
Kane fez a inevitável pergunta, seguindo o hábito do caucasiano.
– Você fala a minha língua... Como pode ser?
O negro sorriu.
– Eu escravo por muito tempo, garoto. Eu, N’Longa, homem ju-ju, grande feiticeiro. Nenhum negro como eu. Você caçar irmão branco?
Kane rosnou.
– Eu! Irmão! Busco um homem, sim.
O negro acenou.
– Quem sabe você encontre, ahn?
– E ele morre!
Novamente, o negro sorriu e anunciou em troca de nada, chegando um pouco mais próximo:
– Eu poderoso feiticeiro ju-ju. Homem branco, você, caça olhos como leopardo? Sim? Ahn! Ahn! Ahn! Ahn! Ouça, homem branco: homem-com-olhos-de-leopardo, ele e chefe Songa travam conversa poderosa; eles irmãos de sangue agora.
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