Brilha o espaço.
Chega Édipo a Colona, em andrajos, imundo,
Sombra ansiosa a fugir do próprio horror profundo,
Ruína humana a cair de miséria e cansaço.
Mas, quando o ancião vacila, órfão da luz do mundo,
— Antígona lhe estende o coração e o braço,
E, filha e irmã, recolhe ao maternal regaço
O rei sem trono, o pai sem honra, moribundo.
É o ninho (a terra treme...) amparando o carvalho,
A flor sustendo o tronco! Édipo (o espaço brilha...)
Sorri, como um combusto areal bebendo o orvalho.
É o fim (rola o trovão...) da miseranda sorte:
O cego vê, fitando o céu do olhar da filha,
Na cegueira o esplendor, e a redenção na morte.
Madalena
"Maria Madalena, Maria de Tiago, e
Salomé compraram aromas, para irem
embalsamar a Jesus. Mas, olhando,
viram revolvida a pedra... E Jesus,
tendo ressurgido, apareceu primeiramente a Maria Madalena."
(S. MARCOS cap. XVI.)
Quedaram, frio o sangue, as mulheres chorosas,
Sem cor, sem voz, de espanto e medo. E, de repente,
Caíram-lhes das mãos as ânforas piedosas
De bálsamo odoroso e de óleo recendente.
Enfeitiçou-se o chão de um perfume dormente,
E o arredor trescalou de essências capitosas,
Como se a terra toda abrisse o seio, e o ambiente
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Se enchesse de jasmins, de nardos e de rosas.
E Madalena, muda, ao pé da sepultura,
Tonta da exalação dos cheiros, em delírio,
Viu que uma forma, no ar, divinamente bela,
Vivo eflúvio, vapor fragrante, alva figura,
Aroma corporal, pairava...
Como um lírio,
Num sorriso, Jesus fulgia diante dela.
Cleópatra
"Cleopatra diffidava... Fu persuasa che
il vincitore la destinava al trionfo...
Ottaviano, corse in gran fretta a salvare
la sua preda, la trovó, sul letto, adorna
della sua piú bella veste di regina,
addormentata per sempre..."
(G. FERRERO - Grandezza e decadenza
di Roma.)
Não! que importava a queda, e o epílogo do drama:
O trono, o cetro, o povo, o exército, o tesouro,
As províncias, a glória, e as naus, no sorvedouro
De Actium, e Alexandria entregue ao saque e à chama?
Não! que importava o horror da entrada em Roma: a fama
De Otávio, e o seu triunfo, entre a púrpura e o louro,
E a plebe em grita, e o céu cheio das águias de ouro,
E o Egito, e o seu império, e os seus troféus, na lama?
Não! Que importava o amor perdido? Que importava
O naufrágio do orgulho, a vergonha, a tortura
Do ódio do vencedor ou da piedade alheia?
Mas entrar desgrenhada, envelhecida, escrava,
Rota, sem o arraiar da sua formosura,
Sol sem fulgor...
Matou-a o medo de ser feia.
A Velhice de Aspásia
Velha, Aspásia, como um clarão, na Academia
E na ágora, surgia e ofuscava as mais belas;
E, sob as cãs, e sob as roupagens singelas,
Aureolada do amor de Péricles, sorria...
Do Helesponto, do Egeu, do Jônio, em romaria,
Vinham vê-la e admirá-la efebos e donzelas.
E eles: "Que sol nos teus cabelos brancos!" E elas:
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"Brilha mais do que a aurora o final do teu dia!"
Ela e a Acrópole, frente a frente, alvas, serenas,
Unidas no esplendor, gêmeas na majestade,
Eram a forma e a idéia, iluminando Atenas.
Aspásia, deusa clara e simples, na moldura
Do céu, nume feliz, perfumava a cidade...
Era uma religião a sua formosura!
A Rainha de Sabá
"O rei Salomão deu à rainha de Sabá o
que ela lhe desejou, e lhe pediu, afora
os presentes que ele mesmo lhe deu
com liberalidade real. A rainha voltou, e
se foi para o seu reino com os seus servos."
(REIS, L. III, cap. X, 13.)
"Que mais queres? Sião? e, entre os bosques sombrios,
O meu colar de cem cidades deslumbrantes?
O Líbano, pompeando em paços, em mirantes,
Em cedros, em pavões, em corças, em bugios?
O povo de Israel, em tribos formigantes
Do Eufrates ao mar Morto e o Egito? Os meus navios,
As esquadras de Hirão, coalhando o oceano e os rios,
Atestadas de prata e dentes de elefantes?
O meu leito, ainda olente e morno do teu sono?
O cetro? O gineceu, e a guarda, e as mil mulheres
Como escravas, rojando aos teus pés? O meu trono?
Os vasos do holocausto? O templo de ouro e jade?
A ara, em sangue e fulgor, ante Jeová?... Que queres?"
— "O teu último beijo... o deserto... e a saudade..."
A Morte de Orfeu
"Em vão as bacantes da Trácia procuram
consolá-lo.
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