Agora meu caminho estava praticamente bloqueado por um súbito promontório, tornado quase intransitável por fragmentos caídos do rochedo. A noite estava próxima, quando, na direção do mar, elevou-se, como se ao agitar da vara de um mago, uma escura teia de nuvens, maculando o firmamento azul-celeste de fim de tarde e escurecendo e perturbando o até então plácido oceano. As nuvens possuíam estranhas formas fantásticas e mudavam, e se misturavam, e pareciam ser impelidas por poderoso feitiço. As ondas ergueram suas cristas brancas; o trovão a princípio emudeceu, então rugiu através da amplidão das águas, que adquiriram um escuro tom púrpura, salpicado de espuma. O lugar onde eu estava dava, de um lado, para o extenso e largo oceano; do outro, era bloqueado por rugoso promontório.
Contornando esse cabo, surgiu de repente, tocado pelo vento, um navio. Em vão, os marujos tentavam forçar seu caminho para o mar aberto – o temporal o impelia para as rochas. Ele sucumbirá! Todos a bordo sucumbirão! Quisera estar entre eles!
E, para o meu jovem coração, a ideia da morte surgiu pela primeira vez misturada com a da alegria. Era uma visão terrível observar aquele barco lutar com seu destino. Eu mal conseguia distinguir os marinheiros, mas os ouvia. Logo estaria tudo acabado! – Uma pedra, mal coberta pelas ondas agitadas, e assim mesmo despercebida, jazia à espera de sua presa. O estrondo de um trovão rompeu sobre minha cabeça no momento em que, com um medonho impacto, o esquife projetou-se contra seu inimigo invisível. Num curto espaço de tempo, transformou-se em pedaços. Ali permaneci, em segurança, e ali estavam meus semelhantes lutando, quão inutilmente, contra o aniquilamento. Pareceu-me vê-los pelejar – na verdade, eu ouvia seus gritos superando as vagas ruidosas em sua estridente agonia. A negra arrebentação jogava aqui e ali os fragmentos do naufrágio: em pouco tempo desapareceram.
Eu estava fascinado assistindo àquilo até o fim. Então, finalmente, caí de joelhos, cobri o rosto com as mãos e novamente ergui a vista. Algo flutuava nos vagalhões em direção à praia. Cada vez mais e mais se aproximava. Seria uma forma humana? Tornava-se cada vez mais aparente. Finalmente, uma forte onda, erguendo toda a carga, depositou-a sobre uma pedra. Um ser humano cavalgando um baú de navio! Um ser humano! Mas seria mesmo? Certamente aquilo nunca existira: um anão disforme, olhos vesgos, feições distorcidas e corpo deformado, um terror de se olhar. Meu sangue, havia pouco tão cálido em relação a um semelhante arrancado do túmulo aquoso, gelou no coração. O anão desceu de seu baú e afastou o cabelo liso e esparso de seu odioso semblante.
– Por São Belzebu! – exclamou. – Me livrou de uma boa. – Olhou em volta e me viu. – Oh, com os demônios! Eis ali outro aliado do poderoso. A que santo você oferece suas preces, amigo... senão ao meu? Mas não me lembro de tê-lo visto a bordo.
Encolhi-me diante do monstro e de sua blasfêmia. Novamente me questionou e produzi uma resposta inaudível. Ele continuou:
– Sua voz é afogada por esse rugido dissonante.
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