Que ruído faz o grande oceano! Colegiais arrojando-se de sua prisão não são mais ruidosos do que essas ondas sendo liberadas para brincar. Elas me perturbam. Não desejo mais sua berraria inoportuna. Silêncio, ancião! Ventos, vão embora... para suas casas! Nuvens, voem para os antípodas{3} e deixem nosso céu claro!
Enquanto falava, ele estendia os dois longos braços magros, semelhantes a garras de aranha, que pareciam abraçar a amplidão à sua frente. Foi um milagre? As nuvens se dividiram e partiram; o céu azul logo espreitou e se tornou um amplo campo tranquilo acima de nós; os ventos tempestuosos foram trocados pela suave brisa que soprava do oeste; o mar se acalmou; as ondas diminuíram para marolas.
– Gosto de obediência, mesmo desses elementos estúpidos – disse o anão. – Mais ainda da indomável mente humana! Deve admitir que foi um temporal e tanto... e tudo obra minha.
Era tentadora providência dialogar com aquele mago. Mas o poder, em todas as suas formas, é digno de veneração pelo homem. Espanto, curiosidade, um pegajoso fascínio me atraíram na direção dele.
– Venha, não tenha medo, amigo – disse o coitado. – Sou bem-humorado, quando agradado; e algo me agrada no seu corpo bem-proporcionado e em seu belo rosto, embora você pareça um pouco acabrunhado. Você sofreu uma avalanche, um naufrágio. Talvez eu consiga aliviar a tempestade de sua sorte como fiz com a minha. Vamos ser amigos? – Ele estendeu a mão; eu não consegui tocá-la. – Bem, então seremos companheiros. Isso também servirá. E agora, enquanto descanso após o contratempo pelo qual acabei de passar, diga-me por que, jovem e vistoso como parece, você vagueia assim sozinho e abatido por esta costa selvagem.
A voz do coitado era estridente e horrenda, e suas contorções, enquanto falava, eram medonhas de ver. Contudo, ele exercia um pouco de influência sobre mim, a qual eu não conseguia controlar. Então lhe contei a minha história. Quando acabei, ele gargalhou alto e demoradamente; as pedras traziam o som de volta num eco: o inferno parecia gritar à minha volta.
– Oh, tu, sobrinho de Lúcifer! – disse ele. – Então foste também vítima do teu orgulho e, embora brilhante como o filho da manhã, estiveste disposto a abrir mão da tua boa aparência, da tua noiva e do teu bem-estar, em vez de te submeteres à tirania do bem. Pela minha alma, exalto tua escolha! Então fugiste e te conformaste e pretendes morrer de fome nestas pedras e deixar que as aves arranquem teus olhos mortos, enquanto teus inimigos e tua noiva se regozijam com tua ruína. A mim me parece que teu orgulho é estranhamente aparentado à humildade.
Enquanto ele falava, mil pensamentos dotados de garras arranhavam meu coração.
– O que acha que eu deveria fazer? – berrei.
– Eu? Ora, nada, mas deite-se e diga as suas preces antes de morrer. Só que, se eu fosse você, saberia o que deveria ser feito.
Aproximei-me dele. Aos meus olhos, seus poderes sobrenaturais o tinham tornado um oráculo. Contudo, uma estranha, sinistra palpitação percorreu meu corpo quando eu disse:
– Fale! Ensine-me. Que ação você aconselha?
– Vingue-se, homem! Humilhe seus inimigos. Pise no pescoço do velho e se aposse de sua filha!
– Para leste e para oeste me voltei! – bradei. – E não vejo como! Se eu tivesse ouro, muita coisa poderia conseguir, mas, pobre e sozinho, sou impotente.
O anão estava sentado em seu baú enquanto ouvia a minha história. Então desceu e pressionou uma mola, e o baú abriu-se! Que fortuna fabulosa – joias fulgurantes, ouro reluzente e a pálida prata – revelou-se em seu interior! Um louco desejo de possuir esse tesouro nasceu dentro de mim.
– Sem dúvida – afirmei –, alguém tão poderoso quanto você é capaz de fazer qualquer coisa.
– Que nada – disse o monstro humildemente.
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