Durante a noite escura dormi e sonhei com a realização dos meus desejos. Dois sóis já haviam se posto, e o terceiro alvorecia. Fiquei agitado, temeroso. Ó expectativa, que coisa terrível és tu quando despertada mais pelo temor do que pela esperança! Como deves serpear em volta do coração, torturando suas pulsações! Como deves dardejar pontadas desconhecidas por todo o nosso frágil mecanismo, ora parecendo nos despedaçar como vidro quebrado, ora dando-nos uma força renovada, a qual nada pode fazer, e desse modo nos atormenta com uma sensação, como a que um homem forte deve sentir quando não consegue romper os seus grilhões, embora estes se dobrem em suas mãos. Lentamente caminhou a brilhante esfera para cima no céu oriental; muito ela demorou-se em seu zênite e ainda mais lentamente vagueou para baixo, para oeste; tocou a beira do horizonte – estava perdida! Seu resplendor estava no cume do rochedo. Ele se tornava pálido e cinzento. A estrela vespertina mostrou seu brilho. Ele logo estará aqui.

Ele não veio! Pelos céus viventes, ele não veio! – e a noite arrastou sua exausta extensão, e, no declínio de sua era, “o dia começou a grisalhar seu cabelo escuro” (em Werner, de LORD Byron){4}, e o Sol ergueu-se novamente sobre o mais infeliz miserável que sempre repreendeu sua luz. Três dias assim eu passei. As joias e o ouro – oh, como os abominei!

Ora, ora, não enegrecerei estas páginas com demoníacos desvarios. Eram todos terríveis – os pensamentos, o feroz tumulto de ideias que enchiam minha alma. Ao final desse período, dormi; não o fazia desde o terceiro pôr do sol; e sonhei que me encontrava aos pés de Juliet, e ela sorria, em seguida dava um grito agudo, pois via a minha transformação, e novamente sorria, pois seu belo amado continuava ajoelhado à sua frente. Mas não era eu, era ele, o demônio, metido nos meus membros, falando com minha voz, cativando-a com meu olhar de amor. Esforcei-me para alertá-la, mas minha língua recusou-se ao seu ofício; esforcei-me para arrancá-lo dela, mas eu estava enraizado no chão. Acordei com a agonia.

Ali estavam os solitários precipícios cobertos de branco. Ali estava o mar esparramando-se, a praia deserta e o céu azul acima de tudo. O que aquilo significava? Teria sido o meu sonho apenas um espelho da verdade? Estaria ele cortejando e cativando minha noiva? Eu retornaria de imediato a Gênova, mas fui desterrado. Soltei uma risada – o berro do anão irrompeu dos meus lábios. Desterrado! Oh, não! Não desterraram estes quatro membros que uso; talvez consiga entrar com eles na minha cidade natal, sem medo de incorrer na ameaçada pena de morte.

Comecei a caminhar em direção a Gênova. De algum modo, já estava me acostumando aos meus membros tortos; nenhum era adaptado para um movimento direto à frente; foi com infinita dificuldade que avancei. E também quis evitar as aldeias espalhadas aqui e ali à beira-mar, pois relutava em exibir a minha feiura. Não tinha muita certeza de que, se me vissem, os meninos não me apedrejariam até a morte quando eu passasse, pois era um monstro. Recebi alguns cumprimentos indelicados dos poucos camponeses ou pescadores que encontrei por acaso. Mas era noite escura quando me aproximava de Gênova. O tempo estava tão fragrante e suave que me ocorreu que o marquês e sua filha provavelmente teriam deixado a cidade e ido para seu retiro no campo. Foi de Villa Torella que eu tentara raptar Juliet; eu tinha levado mais de uma hora fazendo o reconhecimento do lugar e conhecia cada pedaço de chão de seu entorno. A villa ficava belamente situada, cercada de árvores, à beira de um riacho. Ao me aproximar, tornou-se evidente que minha conjectura estava correta; não somente isso, mas que aqueles momentos estavam sendo dedicados a festim e distrações, pois a casa estava toda iluminada. Fragmentos de música suave e alegre adejavam na brisa em minha direção. Meu coração sucumbiu dentro de mim.