Essa é uma arte em que todo detetive deveria se especializar. Bem, partimos chocalhando, e só diminuímos a marcha quando chegamos à rua em questão. Saltei antes de chegarmos à porta da casa, e caminhei pela rua com o modo tranquilo de quem está passeando. Vi o carro se deter. O cocheiro saltou para o chão, e eu o vi abrir a porta e ficar de pé esperando. Mas ninguém saiu do carro. Quando o alcancei, ele estava freneticamente revistando o carro vazio e dando vazão à coleção mais variada de pragas que já ouvi. Não havia sinal, nem vestígio da sua passageira, e receio que ele vai levar um bom tempo para receber o dinheiro da corrida. Ao perguntar no no 13, descobrimos que a casa pertencia a um respeitável forrador de paredes, chamado Keswick, e que os moradores nunca tinham ouvido falar de ninguém chamado Sawyer ou Dennis.

– Você está querendo me dizer – gritei perplexo – que aquela velha fraca e cambaleante foi capaz de sair do carro em movimento, sem que você ou o cocheiro a vissem?

– Velha uma ova! – disse Sherlock Holmes rispidamente. – Nós é que fomos as velhas por termos nos deixado enganar desse modo. Devia ser um jovem, muito ativo, além de ser um ator incomparável. A representação foi inigualável. Ele viu que estava sendo seguido, sem dúvida, e usou esse meio para me despistar. Isso mostra que o homem que estamos procurando não é afinal tão solitário como eu imaginava, mas tem amigos dispostos a correr riscos por ele. Siga meu conselho e vá dormir.

Eu certamente estava me sentindo muito cansado, por isso obedeci à sua recomendação. Deixei Holmes sentado em frente ao fogo em brasa, e ao longo das vigílias da noite escutei os gemidos baixos e melancólicos de seu violino. Sabia que ele ainda estava meditando sobre o estranho problema que decidira desvendar.



Capítulo 6



Tobias Gregson mostra o que sabe fazer

Os jornais do dia seguinte estavam cheios de matérias sobre o “Mistério de Brixton Road”, como o chamavam. Cada um tinha um longo relato do caso, e alguns apresentavam, além disso, editoriais sobre o crime. Não li nenhuma informação que fosse nova para mim. Ainda guardo no meu álbum inúmeros recortes e trechos sobre o caso. Eis o resumo de alguns deles:

O Daily Telegraph observava que era rara na história do crime uma tragédia que apresentasse características mais estranhas. O nome alemão da vítima, a ausência de qualquer outro motivo e a inscrição sinistra na parede, tudo apontava para um crime cometido por refugiados políticos e revolucionários. Os socialistas tinham muitas ramificações na América, e o morto sem dúvida infringira suas leis não escritas, passando a ser alvo de sua perseguição. Depois de aludir vagamente ao Vehmgericht, à aqua tofana, aos carbonários, à Marquesa de Brinvilliers, à teoria darwiniana, aos princípios de Malthus e aos assassinatos de Ratcliff Highway, o artigo concluía admoestando o governo e advogando maior vigilância sobre os estrangeiros na Inglaterra.

O Standard comentava o fato de que violências dessa ordem geralmente ocorriam sob um governo liberal. Nasciam da inquietação das massas e do consequente enfraquecimento de toda autoridade. O morto era um cavalheiro americano que residira durante algumas semanas na metrópole. Ficara hospedado na pensão de Madame Charpentier, em Torquay Terrace, Camberwell. Nas suas viagens, fazia-se acompanhar de seu secretário particular, o sr. Joseph Stangerson. Os dois se despediram da dona da pensão na terça-feira, dia 4 do mês em curso, e seguiram para Euston Station com a intenção expressa de pegar o trem para Liverpool.