pouco mesmo...
FILIPE - Eu, minha Sra., não posso ser insensível ao seu infortúnio; a Sra. está justamente no caso de ser feliz. Não há desgraça que sempre dure. Só a sorte grande a pode salvar.
D. LUÍSA - Que diz, senhor?
FILIPE (tirando os bilhetes) - Um meio, um quarto, um vigésimo! Não perca esta ocasião; não rejeite a fortuna que a procura.
D. LUÍSA - Ora, senhor! Não se ria da desgraça do próximo.
FILIPE - Eu rir-me da desgraça dos outros! Eu que vivo dela!
D. LUÍSA - Estou quase aproveitando os cinco mil-réis de há pouco.
FILIPE - Vamos, resolva-se.
D. LUÍSA - Está bom! Sempre compro um quarto.
FILIPE - Antes um meio.
D. LUÍSA - Não quero; há de ser um quarto.
FILIPE - Aqui tem. (A meia voz) E pede esmolas!...
(Entra uma menina de realejo que pede a gorjeta com um pandeiro.)
D. LUÍSA - Sai-te, vadia! A polícia não olha para estas coisas.
FILIPE - É verdade; não sei para que servem as autoridades.
D. LUÍSA - Deixam as pessoas honestas serem perseguidas por esta súcia de mendigos...
FILIPE - Que não têm profissão.
(Saem à direita; JÚLIA, D. MARIANA e BRAGÁ entram do interior da loja.)
CENA XVI
JÚLIA, D. MARIANA, BRAGA
(BRAGA traz uma caixa de corte de vestido.)
D. MARIANA - São muito bonitos os vestidos; você soube-os escolher, Júlia.
BRAGA - A senhora tem muito bom gosto.
JÚLIA - Mande deixar isto no meu carro.
BRAGA - Vou eu mesmo. (Sai pelo fundo.)
CENA XVII
ERNESTO, JÚLIA, D. MARIANA
ERNESTO (entrando à direita todo enlameado) - Bonito!... Estou fresco.
D. MARIANA (rindo) - Ah! ah! ah!
JÚLIA - O que é isto, Ernesto?
ERNESTO - O que vê, prima. A sua Rua do Ouvidor pôs-me neste estado miserável! Uma maldita carroça! Estúpidos que não olham para quem passa!
JÚLIA [sorrindo] - Foi uma vingança, primo; o senhor acabava de dizer mal do Rio de Janeiro.
ERNESTO - E não tinha razão? Uma cidade de lama! Felizmente já mandei tomar a minha passagem. [Entra Teixeira.]
JÚLIA - Como! Sempre vai amanhã?
ERNESTO - Que dúvida! E até por segurança embarco hoje mesmo.
CENA XVIII
Os mesmos, TEIXEIRA
TEIXEIRA - Que é isto! Falas em embarcar. Para onde vais?
ERNESTO - Volto para São Paulo, meu tio.
JÚLIA - Veio-lhe agora esta idéia! Diz que não gosta da corte, que é uma terra insuportável...
D. MARIANA - Um inferno!
TEIXEIRA - Caprichos de rapaz! Não há cidade como o Rio de Janeiro. É verdade que já não é o que foi. Bom tempo, o tempo das trovoadas. Que diz, D. Mariana?
D. MARIANA - Tem razão, Sr. Teixeira.
ERNESTO - Faço idéia! Se sem as tais trovoadas estou neste estado!
TEIXEIRA - Não sabes o que dizes. As trovoadas é que nos preservam da febre amarela, do cólera e de todas essas moléstias que nos perseguem agora.
ERNESTO - Não quero contrariá-lo, meu tio; a sua corte é bela, é magnífica, com ou sem trovoadas.
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